13.5.05

Jayme Caetano Braun- o último payador, versava a sua dor com a viola em compasso, cantava batalhas, amores, a dura lida campeira, o homem simples, o tempo, e a história missioneira.
Sua rima crua e singela, trazia a sensação mais bela, nos dava paz e conforto.
Hoje, o payador jaz morto... Mas deixou o seu legado, que ecoa no vento gelado da consciência humana e transforma esta chama na sua eterna morada.

Esta é minha homenagem, e estas são suas palavras:

PAYADA


Raízes- troncos ramagens
Ramagens- troncos raiz
Abriu-se uma cicatriz
De onde brotei na paisagem
O tempo me fez mensagem
Que os ventos pampas dirigem
Dos anseios que me afligem
De transplantar horizontes
Buscando o rumor das fontes
Pra beber água na origem.

Sobre o lombo da distância
De paragem em paragem
Fui repontando a mensagem
De bárbara ressonância
Fazendo Pátria na infância
Porque resolvi faze-la
E a liberdade sinuela
Sempre foi a estrela guia
Que o meu olhar perseguia
Como quem busca uma estrela.

Pensei chegar a alcança-la
No estágio de índio rude
Mas nunca na plenitude
Porque essa deusa baguala
Que aos andejos embuçala
Nunca ninguém alcançou
Bisneto nem bisavô
Nos entreveros mais brutos
Labareda de minutos
Que o tempo sempre apagou...

Primeiro era o campo aberto
Descampado sem divisas
Com fronteiras imprecisas
Mundo sem longe nem perto
Eu era o índio liberto
Barbaresco e peleador
Rei de mim mesmo senhor
Da natureza selvagem
-A religião da coragem
E o sol de bronze na cor.

Um dia veio o jesuíta
A este rincão do planeta
Vestindo a sotaina preta
Da catequese bendita
Foi mais do que uma visita
À minha pampa morena,
Bombeei por trás da melena
Olhos nos olhos o irmão
E gravei no coração
A santa cruz de Lorena.

Mais tarde veio mais gente
A minha terra campeira
A falange das bandeiras
Impiedosa e inclemente
Me levantei - frente a frente
E as tribos se levantaram
As várzeas se ensangüentaram
Elas que eram verdejantes
Mas eu venci os bandeirantes
Que nunca mais retornaram.

E depois vieram os Lusos
Os Negros- os Castelhanos
E nos pagos campechanos
Novas normas- novos usos
As violências- os abusos
Da Ibéria - Castela e Láscio
E rasgaram o prefácio
E mataram as plegárias
E as ânsias comunitárias
Dos irmãos de Santo Inácio

Não pude deter a vaga
De Andonegui e Barbacena
Se a história não os condena
A mancha nunca se apaga
A opressão jamais indaga
Na sua opressão mesquinha
Era meu tudo o que tinha
Era meu tudo que havia
E eu morri porque dizia
Que aquela terra era minha.

Mas o eterno não morre
Porque permaneço vivo
No lampejo primitivo
Na velha raça gaudéria
Corcoveando em cada artéria
Pela miscigenação
Na bárbara transfusão
Com os andarengos da Ibéria

Fui sempre aquilo que sou
Sou sempre aquilo que fui
Porque a vida não dilui
O que a mãe terra gerou
Sou o brasedo que ficou
E aceso permaneceu
O gaúcho que cresceu
Junto aos fortins de combate
E já estava tomando mate
Quando a Pátria amanheceu.

E assim- crescendo ao relento
Criado longe do pai
Junto ao mar doce- Uruguay
O rio do meu nascimento
Soldado sem regimento
No quartel da imensidade
Um dia me deu vontade
Deixei crescer toda a crina
E me amasiei com uma china
Que chamei de liberdade.

Por mais de trezentos anos
Fui pastor e sentinela
Na linha Verde-Amarela
Peleando com castelhanos
Gravando com `` los hermaños``
A epopéia do fronteiro
Poeta- cantor e guerreiro
Da América que nascia
Na bendita teimosia
De continuar brasileiro.

Com Bento em mil entreveros
Em barbarescos ensaios
Depois contra os Paraguaios
Em Humaitá e Toneleros
Andei em Monte Caseros
Paissandu e Peribebuy
Passo da Pátria, Avay
Longe do meu território
E fui ordenança de Osório
Nos campos de Tuyuty.

Depois em noventa e três
Andei peleando outra vez
Sem soldo no fim do mês
Porquê pelear era lindo
As espadas retinindo
Chapéu batido na copa
Como carneador de tropa
Nas forças de Gomercindo.

Mais adiante em vinte e três
E vinte e quatro de novo
É o destino do meu povo
Que assim altivo me fez
A marca da intrepidez
Deste velho território
Ante o bárbaro ostensório
Dos lenços rubros e brancos
Acompanhei os arrancos
Do velho Flores e Honório.

Chimangos e Maragatos
Farrapos- Federalistas
Caminhadas e conquistas
Que a história guarda em seus fatos
Os tauras intemeratos
De adaga e pistola à cintura
Não há ninguém que desminta
Nossa estirpe de raiz
Que se adonou da matriz
Nas arrancadas de trinta.

Depois vesti a verde-oliva
Desta vez como voluntário
No corpo expedicionário
Formando uma comitiva
Da nossa indiada nativa
Pra responder um libelo
E o pendão Verde-Amarelo
No outro lado do mundo
Cravei bem forte e bem fundo
No velho Monte Castelo.

Hoje o tempo demudado
Meu coração continua
O mesmo tigre charrua
Das andanças do passado
Sempre de pingo encilhado
Bombeando pampa e coxilha
A Pátria é minha família
Não há Brasil sem Rio Grande
E nem tirano que mande
Na alma dum Farroupilha!

Jayme Caetano Braum

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1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Enquanto soprar o Minuano O Jayme estará vivo...

7:49 PM  

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