
Augusto dos Anjos, poeta capixaba nascido em 1884, destilava em vida seus poemas causticantes publicando um único e definitivo livro com o título de EU em 1912, como podemos perceber nestas pequenas amostras:
A Idéia
De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!
Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!
Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas do laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica ...
Quebra a força centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo da língua paralítica.
Versos Íntimos
Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão - esta pantera-
foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O homem, que, nesta terra miserável,
mora, entre as feras, sente inevitável
necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
a mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
apedreja essa mão vil que te afaga,
escarra nessa boca que te beija!
Faleceu em 1914 na cidade de Leopoldina-MG. Diz a lenda que quando ocorreu seu falecimento, sua mulher, dona Ester teria corrido aos gritos pela cidade anunciando: ``Morreu o magro, morreu Augusto, não sei se de tuberculose ou de susto``.
Pois Augusto do Anjos, teria 32 anos depois, se manifestado nesta mesma cidade com os versos psicografados em sessão pública pelo notório médium espírita Fransisco Cândido Xavier, o Chico Xavier.
Abstraindo-se qualquer crença, fica aqui o registro impressionante, curioso ou herético, da passagem com suposta autoria deste nosso grande poeta brasileiro:
Aos Investigadores da Verdade
Debalde procurais a alma divina
No acervo de bactérias e de humores,
No banquete dos vermes gozadores
Que o processo anatômico examina.
Prisioneiros do cálcio e da albumina,
Mergulhados no pântano das dores,
Sois, ainda, veros sofredores,
Vencendo a noite em sombra, sangue e ruína.
Findo o baile macabro dos instintos,
No cárcere trevoso dos helmintos,
Voltareis à verdade augusta e forte!
E, vencidos no horror do último cerco,
Encontrareis no túmulo de esterco
A claridade angélica da morte!...
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